Enfrentando a pandemia longe de casa
- O Mundo é a minha casa
- 20 de abr. de 2020
- 4 min de leitura

Há pouco mais de um mês o Governo Português decretou o início da quarentena obrigatória em virtude da pandemia global do Covid-19, e consequentemente mudou a rotina dos milhões de portugueses e imigrantes que vivem em terras lusitanas. Como alguns de vocês já sabem, estou morando no #Porto desde o final do ano passado, e sigo em fase de adaptação e aprendizagem, o que torna a situação ainda mais sui generis.
É mais do que evidente que as pessoas têm experimentado o isolamento de formas diferentes, variando basicamente de acordo com suas rotinas prévias e estado de espírito. Entretanto, conversando com alguns amigos percebi que a vivência da quarentena segue mais ou menos um padrão ou linha de acontecimentos: 1) Fase inicial: abstinência. Quase como se estivéssemos todos vivendo numa espécie de adicção contínua em trabalho e compromissos sociais, que ficar em casa tornou-se um verdadeiro sacrifício. Por mais delicada que seja a situação da pandemia, a primeira semana foi um verdadeiro tormento, prisão em casa; 2) Fase de vivência: aceitação. Após o impacto inicial, o jeito foi mesmo abraçar a nova rotina, torcer para que o problema acabe logo e aproveitar a convivência com a família na medida do possível. Momento de encontrar novos passatempos ou de adaptar-se à nova realidade, principalmente para turma que foi gentilmente compelida a exercer o teletrabalho. 3) Fase de retomada: superação. A sensação de que o pior já passou faz com que as pessoas desejem paulatinamente a retomada das atividades e a volta ao convívio social. Porém, é preciso superar o medo e agir com responsabilidade na volta à normalidade.
Considerando minha recém iniciada jornada de expat, as coisas não foram tão linear como narrei acima a partir das minhas observações nada científicas. O processo todo é um pouco mais complexo. Eu comecei a quarentena super agradecida pelo simples fato de poder dormir e descansar um pouco mais, afinal vivi os meus primeiros quatro meses no Porto muito intensamente e algumas horinhas extras de sono seriam mais do que bem-vindas. Trabalho, estudo, vida social, relacionamentos, tudo foi elevado à máxima potência desde que desembarquei nessa aventura incrível. Assim, superado o cansaço físico, abracei a situação e o tempo ocioso, retomei alguns projetos pessoais que estavam parados, estudei francês em duas plataformas diferentes, tentei me exercitar com alguma frequência, li um par de livros (virtuais), ouvi 1 zilhão de músicas no Deezer (sou muito viciada, tenho que fazer um post só sobre streaming de música), assisti inúmeros vídeos no Youtube e lógico acompanhei as lives dos meus artistas favoritos nas redes, culminando no show #OneWorldTogetherAtHome sob a curadoria da Lady Gaga. Isso tudo sem mencionar minha paixão absoluta por cinema e seriados, então seguramente assisti boa parte da minha #watchlist na Netflix e no Amazon Prime. Porém, sinto que estou um pouco cansada de distanciamento social e isolamento, sou uma mulher do povo. Gosto de contato.
Explico. De uma forma geral, me considero uma pessoa positiva e otimista, uma daquelas criaturas que tendem a olhar o copo metade cheio ao invés de metade vazio e que tenta tirar o melhor de cada situação ainda pareça difícil. Certa vez, lembro-me de ter passado por um episódio interessante, quando eu e uma grande amiga viajávamos de carro de Ithaca para NYC, sem conhecer direito o percurso e as condições da estrada, e nos perdemos. O carro que ela alugara era um daqueles veículos espaçosos e potentes, tipo sportage, tínhamos o GPS no celular e uma voz indicando os próximos passos, pistas bem sinalizadas, condições climáticas e temperatura favoráveis, e mesmo assim conseguimos nos enfiar no meio de um milharal qualquer, perdidas no interior do estado do Nova Iorque. Eu, como uma boa co-pilota, tentava acalmar a motorista com conversas amenas, destacava a beleza da paisagem que apreciávamos e dizia que logo encontraríamos uma saída e uma ajuda que nos colocaria de volta ao trajeto previsto. E assim aconteceu. De repente, no meio do nada, encontramos um posto de combustível, reabastecemos o carro e as nossas próprias energias e seguimos com destino à Manhattan. Quando revivemos essa história, minha amiga sempre destaca a calma, o pensamento positivo e a tranquilidade com que enfrentei a situação toda e morremos de rir. Mas a verdade é que eu provavelmente estava tão assustada quanto ela, vendo a gasolina do carro esvair-se a cada volta, rezando para que o sinal do GPS voltasse e pedindo a Deus algum tipo de intervenção divina que pudesse nos resgatar. A diferença é que optava por pensar em desfechos mais positivos e aproveitar na medida do possível a experiência dentro da experiência. E é mais ou menos assim também com relação à pandemia. Sigo com medo, respeitando o estabelecido pelas autoridade, mas escolho a positividade e não a histeria.
Nessa fase final da primeira quarentena (acredito que teremos outras até a implementação da vacina) me sinto bastante cansada do isolamento, da falta de interação social, da impossibilidade de frequentar os lugares que gosto, de não estar conviver com meus amigos fisicamente, de aproveitar a noite na Baixa ou o pôr-do-sol no Jardim do Morro, e tantas outras pequenas alegrias que fazem nossa rotina um pouco menos estressante. Isso sem falar que estou longe da minha família, morro de saudade deles, dos meus cachorros, do clima, e de tudo que sempre fez parte da minha vida, e que em tempos de quarentena ganham uma importância ainda maior. Entretanto, assim como o episódio ocorrido no EUA, escolho me manter bem e mentalmente saudável, positiva, agradecendo a Deus pela saúde dos meus, desejando apenas que tudo passe o mais rápido possível e que possamos restabelecer nossas vidas tão logo seja possível. Meanwhile, let's stay home e tirar o máximo de lições possíveis dessa experiência. :)
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